O Ano do Laicato no Brasil
Os cristãos leigos e leigas são chamados a fazer cada vez mais parte ativa da missão da Igreja, que é, em síntese, restaurar a mensagem e a vivência de Jesus Cristo em tudo

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil instituiu 2018 como o ano do laicato, ou seja, o ano de pensar o papel dos leigos e das leigas dentro da Igreja, com o chamado de participar na vida eclesial.
Em boa hora, a CNBB, houve por bem editar, após um tempo adequado de discussões, análises e maturação, o Documento 105, intitulado “Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade - Sal da Terra e Luz do Mundo” (cf. Mt 5,13-14), que foi aprovado na 54ª Assembleia Geral da CNBB, realizada em Aparecida, nos dias 6 a 15 de abril de 2016.
O Documento 105 retoma e aprofunda a participação dos leigos e das leigas na Igreja e na sociedade. Chamados pelo Batismo e pela Crisma ao seguimento de Jesus Cristo, os leigos e as leigas assumem a responsabilidade de serem sujeitos na Igreja e na sociedade: sal e luz!
O Documento 105 tem como perspectiva a afirmação dos cristãos leigos e leigas como verdadeiros sujeitos eclesiais. Esta expressão - sujeitos eclesiais - é recorrente em todo o texto e se fundamenta nos ensinamentos do Concílio Vaticano II e do Magistério subsequente da Igreja. Pretende-se animar os cristãos leigos e leigas a compreenderem a sua própria vocação e missão, levando-os a atuar como verdadeiros sujeitos eclesiais nas diversas realidades em que se encontram inseridos, reconhecendo o valor de suas atividades na Igreja e no mundo. Como sujeitos eclesiais, não são uma realidade pronta, mas um dom que se faz compromisso permanente para toda a Igreja, em sua missão evangelizadora, sempre em comunhão com os demais membros do Corpo Místico de Cristo.
O Documento 105 segue a tríplice metodologia do ver, julgar e agir e divide-se em três capítulos. O primeiro apresenta inicialmente o marco histórico-eclesial da caminhada da vida dos cristãos leigos e leigas, com seus avanços e recuos e, de modo sucinto, as diversas faces do laicato. Em seguida, expõe uma visão panorâmica, em ótica sócio-pastoral, do mundo globalizado em que vivemos. Por fim, desenvolve alguns discernimentos necessários para que se possa analisar a problemática do mundo atual, algumas tentações que ele nos apresenta, a fim de propor uma mudança necessária de mentalidade e de estruturas, tudo alicerçado nos valores cristãos.
O segundo capítulo, em perspectiva eclesiológica, trata da eclesiologia que nos foi ensinada pelo Concílio Vaticano II, tendo em vista a comunhão na diversidade, como base para a compreensão da identidade e da dignidade laical como sujeito eclesial.
A atuação dos leigos como sujeitos leva em consideração a diversidade de carismas, serviços e ministérios na Igreja. Todos com Jesus. Tudo para Deus.
O terceiro capítulo trata da ação transformadora dos cristãos leigos e leigas na Igreja e, sobretudo, no mundo. Cuida da dimensão missionária da Igreja, desenvolve aspectos da espiritualidade encarnada, recorda aspectos da história da organização do laicato no Brasil, e indica aspectos, princípios e critérios da formação do laicato. Em seguida, aponta lugares específicos da ação dos cristãos leigos e leigas no mundo de hoje, para, enfim, concluir com enunciados indicativos, encaminhamentos e compromissos para a caminhada do laicato no nosso país, que tanto tem sofrido e feito o povo sofrer, por conta da ação destrutiva de muitos agentes públicos e privados, que têm saqueado e envergonhado o nosso povo.
Ainda persiste na Igreja uma noção errada de que os clérigos (bispos, padres e diáconos, em oposição aos leigos, que são todos os demais fiéis) são os “mais importantes e os protagonistas” da Igreja, enquanto os leigos são “os que escutam”, que passivamente se alimentam daquilo que os clérigos possuem para dar. A esse clericalismo, o Concílio Vaticano II respondeu voltando a afirmar a dignidade e a missão fundamental dos leigos na Igreja. Somos todos nós, clérigos e leigos, membros do Corpo Místico de Jesus Cristo, ou seja, da Igreja, cuja cabeça é o seu próprio instituidor, o Filho Unigênito de Deus, que disse de forma clara: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja” (Mt 16,18).
Por sua realidade de batizados, todos os leigos e leigas não apenas estão na Igreja, mas são Igreja, assim como os clérigos. Como tais, são também chamados a ser discípulos missionários, participantes da missão da Igreja de anunciar o Evangelho a todas as pessoas. E para isso eles precisam experimentar de forma renovada que o seu encontro com Jesus é verdadeiro, a fim de anunciá-Lo em primeiro lugar. Isso acontece por meio de uma vida de oração intensa e de ação continuada, em que se alimenta da mensagem de Jesus e se experimenta a sua graça, que nunca falta.
A partir dessa renovação, busca-se superar alguns antagonismos que se apresentam muito vivos e desafiadores. Um primeiro antagonismo é o que se dá entre a fé e a vida, que faz referência a uma espécie de separação da vida de fé e da vida cotidiana, como se as duas realidades não se relacionassem. Já se disse que muitos vivem, hoje, uma espécie de agnosticismo funcional, no qual a fé não questiona mais a vida cotidiana. Estes são os cristãos que se limitam à missa do Domingo e dos dias de festa, quando o verdadeiro chamado de Deus é para ter uma vida inteiramente cristã, no dia a dia. Não só no Domingo, não só nos dias festivos. Os caminhos de Jesus devem ser seguidos todos os dias. A sua verdade, todos os dias anunciada. E a sua vida, vivida e partilhada a cada momento.
Outro antagonismo que precisa ser superado acontece entre a Igreja e o Mundo. Muitos podem pensar que a Igreja é uma espécie de refúgio, no qual se pode fugir do mundo ameaçador. Não se pode deixar de compreender que é verdade que na Igreja encontramos esse espaço de paz verdadeira, mas, precisamos reconhecer que é essencial que essa paz chegue a todos os lugares e a todas as pessoas. Com sua encarnação, Cristo deu valor significativo ao mundo e aos homens, e é por isso que não devemos fugir do mundo, mas devemos buscar a sua transformação, de acordo com o máximo das nossas capacidades e possibilidades, fazendo com que esteja cada vez mais de acordo com Cristo e o Reino de Deus que Ele veio anunciar.
Os cristãos leigos e leigas são chamados a fazer cada vez mais parte ativa da missão da Igreja, que é, em síntese, restaurar a mensagem e a vivência de Jesus Cristo em tudo. A Igreja está no mundo. O mundo não deverá mudar a Igreja. Esta, sim, é que deve transformar o mundo em que vivemos, pela Boa Nova do Filho de Deus.
Que todos nós, clérigos, religiosos/as, leigos e leigas, possamos nos unir muito mais ainda, tendo em vista o nosso amor e a nossa fidelidade ao Evangelho do nosso Salvador Cristo Jesus.