top of page

Eucaristia: Pão das virtudes


Ao lermos a carta que contém as últimas palavras do seminarista São Luís Gonzaga à sua mãe, mostrando-nos que, cada dia, é ocasião para desejar a finalidade primeira, a santidade, a ser vivida nos estágios atuais de nossa vida, do nosso presente, vemos que, ao lado da avidez que tinham para o céu, os santos também precisavam lutar para abraçar as virtudes, dons de Deus.

A vida era entendida por Luís Gonzaga como um empréstimo feito por Deus, sempre no nosso almejar de bens superiores, maiores. Empréstimo a ser quitado na constância de nossos dias no bem, no belo, no justo, no verdadeiro. Para tanto, no estágio em que ora estamos, tudo deverá ser-me favorável à santidade, ainda que, às importunidades de tentações e pecados recebam um ‘não’ para uma adesão ao que é vontade de Deus. E, para isto, é preciso coragem, ousadia, força. Faz-se extremamente necessária uma comunhão de vida com Deus de maneira que não desfoquemos o nosso olhar, a nossa existência d’Ele, por sabermos que tudo quanto somos, inclusive a determinação em nossos propósitos de santidade, vem d’Ele, Autor e Consumador de nossa fé (cf. Hb 12,1). Sozinhos, com nossas humanas e singelas forças, se quisermos agradar a Deus, nada podemos.

Particularmente, sempre me chamou a atenção o termo ‘viático’ em ligação estrita com a Eucaristia. O ‘Alimento do caminho’ – na vida sacramental e, portanto, litúrgica – está unido à dimensão daquele que está prestes a cruzar os umbrais desta vida para a outra, em passagem pela páscoa da morte. Mas, creio que, num sentido mais profundo, o Pão do caminho está disposto a alimentar-nos na árdua estrada da correspondência à divindade, nesta vida de degredo, de exílio. A Eucaristia alimenta-nos para o bem, fortalecendo a constância do ‘sim’ daquele que, desejoso do céu, vive, não obstante os percalços que nos são postos ao longo da trajetória, consentidos pela Divina Providência, como espécie de prova (cf. Jt 8,25-26a.27). A Eucaristia faz dos fracos, fortes.

Em sua curta e profunda Encíclica, Miræ Caritatis, de 1902, o Papa Leão XIII, debruçando-se sobre a Eucaristia e seus efeitos naqueles que a recebem, lista as virtudes que lhe estão embutidas, “A fim de que resplandeça com maior claridade e brilho qual é a sua oculta força e porque o devemos considerar como meio eficacíssimo para socorrer as necessidades de nossos tempos” (n. 1). A Eucaristia é alimento da alma. Desta forma, a vida do Senhor, recebida no Sacramento, configura a vida do cristão em si mesma. E, trazendo-nos consigo as promessas de eternidade, exorta-nos levar a uma vida de testemunho do Cristo neste mundo, por uma existência na graça, até a felicidade eterna em Deus. Pelo Santíssimo Sacramento ainda, temos a infusão de todas as virtudes sobrenaturais, ao tempo que as incrementa, em especial a fé. Se se olvida da Eucaristia, o homem parte rumo à negação total das verdades da fé, ao tempo em que a ação de crer é rebaixada a um sentimentalismo vazio, estéril.

A Divina Eucaristia refreia as paixões, elas que nos atrapalham na compreensão do mistério, ao tempo em que dá força para o propósito daqueles que se lançam ao serviço do Senhor por uma vida de virgindade, de celibato. O Sacratíssimo Sacramento, por ser semente de imortalidade, faz-nos confiar cada vez mais na esperança da eternidade; faz com que o homem encare com vigor e esperança as dificuldades da vida, inspirado no sacrifício do Cristo, sacrificando também seus prazeres, sacrificando-se. O Pão do Altar fomenta a caridade, a mesma que traz Jesus à terra; faz arder todas as coisas; põe fim à cobiça; sustenta a justiça; excita o amor de Deus entre os homens e promove o amor entre os homens. Por fim, a Eucaristia traz-nos as virtudes teologais, e, com elas, tantas outras forças necessárias à nossa vida cristã.

No Altar, unimos, de sobremaneira, as nossas cruzes cruéis àquela que é a de Cristo mesma, redentora. Tal como um navegador que, para singrar mares até um querido porto, consulta um bom mapa, traçando a sua rota, associando-a ao tempo de percurso e outros elementos mais, que tal fazer esta experiência com Jesus Eucarístico, que sabe do ‘mar da nossa vida’ e das aventuras que nos esperam bem melhor do que sabemos?! Tal experiência é proposta inigualável de cumplicidade com o Senhor. De onde os santos pastores hauriram forças para levar a bom termo toda a sua vida para a santidade senão da Eucaristia, Pão das virtudes?

Aproveitemos a dica dos santos, da Igreja, do Cristo, para, fortificados pelo fruto do Altar, atravessarmos a vida até àquela que não tem fim, onde, plenamente, Deus será em nós e nós n’Ele, numa eterna consumação de amor, iniciada já aqui e agora. Amém.

O Pe. Everson Fontes Fonseca é Administrador da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, Mosqueiro

Artigo publicado originalmente no Correio de Sergipe


bottom of page