O cristão, o aborto e as eleições
Ser cristão é ser inconformado diante de situações de pecados contra Deus e contra o próximo. E o aborto se caracteriza como tal. E o que faremos?

Diante de uma cultura subversiva aos valores morais inspirados pelo Evangelho, e, portanto, à lei natural, que é iluminada pela Palavra de Deus, como cristãos, faz-se mister que ergamos a voz contra a injustiça do aborto, insanidade patrocinada por muitos, inclusive pelos representantes populares, eleitos para favorecerem o bem-comum.
Estamos prestes a encarar mais uma vez as urnas. Nesta feita, tal como em todas as outras, promessas são feitas, nutrindo sonhos embasados em um bordão – quiçá subjetivista – alcunhado por uma emissora que propagandeia a desordem moral e, com seus ditames, visa a destruição das famílias e até da vida humana. Os telespectadores alienados não fazem uma reflexão para desmistificar quais as intenções da divulgadora impertinente de ideias desconexas ao bom senso. Infelizmente, muitos acham que, ser informados por ela, já é o suficiente, alimentando-se culturalmente de seus desmandos, buscando, inutilmente, “O Brasil que eu quero”.
Nos palanques e nos debates, políticos falam de projetos para diversos âmbitos da sociedade brasileira, mas nunca se detêm numa sensata reflexão sobre um “fantasma” que, de tempos em tempos, nos rodeia, fruto da degradação moral em que vivemos, causadora da desconstrução de um conceito pétreo e clarividente do que é pessoa. E, no desenvolvimento tecnológico-científico, antes inimaginado, de vanguarda, perguntas tácitas, fundamentais, pairam: o que é o homem? E mais: quando começa a vida? Qual o valor da vida humana?
Para tais indagações, a Filosofia grega muito nos tem a oferecer. E, se o leitor perguntar: Não estariam os filósofos gregos e seus conceitos superados? Taxativamente, responder-lhe-ia: Não! Não estão. A sacralidade da vida humana é imutável em seus conceitos. E, se o discurso se encaminhar para a Teologia, as respostas acerca da inviolabilidade da vida humana ganham corpo, porque cada expressão de humanidade, sem exceção, é dom de Deus, fruto de Sua bondade, porque, tal como exclamou o Criador, quando da criação da humanidade: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” (Gn 1,26). E isto Deus não disse apenas genericamente quando criou o homem; mas o diz em todas as vezes que, por consentimento divino, brota da união de sémens humanos uma nova vida, bastando o zigoto (biologicamente falando) para que o diga, porque é pessoa com toda a carga de ato de personalidade que existe.
Se é inadmissível que os nossos representantes políticos (ou os que ambicionam sê-los) falam de tudo, mas não tocam no assunto crucial do que pensam da dignidade da vida humana em todas as fases de seu desenvolvimento, tampouco repelem o aborto claramente, ou o se assume em seus posicionamentos e responsabilidades para não enganarem o eleitor brasileiro, que, majoritariamente, é cristão, muito pior é um cristão levantar a bandeira pró-aborto, ou mesmo agremiações que se denominam cristãs-católicas, mas que marcham pelos interesses de tamanha sandice. Horrível é a passividade de fazermos pouco ou nada – subjetivamente ou organizados – em prol da vida humana, desde a sua concepção até o seu declínio natural, enquanto são conjecturados planos pérfidos, desmandos, alavancados por intenções asquerosas de grupos amorais ou, quem sabe até, imorais.
Ser cristão é ser inconformado diante de situações de pecados contra Deus e contra o próximo. E o aborto se caracteriza como tal. E o que faremos? Muitas são as ações que podem reverter a onda abortista que, atualmente, circula: tomarmos consciência do valor inegociável da vida humana desde a sua concepção, quando sémens, ao se encontrarem, já formam pessoa; não endossar programas ou emissoras que almejam minar os valores humanos, iluminados pelo Evangelho, tampouco lhes darmos audiência em assisti-los; não permitirmos, enquanto sociedade organizada, que a esfera judiciária da República, num intruso ato de legislar, seja promotora de injustiças e assassinatos (sim, porque aborto provocado é assassinato e sempre o será!); nas eleições, avaliarmos dos requerentes do nosso voto o que pensam e como lidarão diante da problemática; e mais, caso detectarmos que aquele político defenda a proposta do aborto, jamais o elegermos.
Creio que nunca será demais, enquanto filhos da Igreja, termos diante de nós o que a Sã Doutrina nos instrui acerca do aborto e da sua discussão: [o cristão] “não pode participar numa campanha de opinião em favor de uma lei de tal gênero, nem lhe dar a própria adesão, dar-lhe seu voto ou colaborar em sua aplicação” (CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ: Declaração sobre o aborto provocado, 18 de novembro de 1974, n. 19). E, se objetamos o assassinato violento, o que deveremos pensar quando se trata de uma pessoa inocente e indefesa?
Imploremos a Senhora Aparecida que aclare a consciência do povo brasileiro para que não se conforme diante de propostas absurdas, e que manifeste a sua indignação na ciência de quem elegerá no próximo pleito eleitoral, exigindo direitos que visem o bem e a justiça para todos. Que o Senhor Jesus, que veio “para que todos tivessem vida plenamente” (Jo 10,10), não permita que o aborto se instaure como recurso de lei e converta o coração dos que se dizem cristãos, mas, paradoxalmente, ofendem a vida e a personalidade.
Padre Everson Fontes Fonseca é pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, no Mosqueiro.