A fé para o Reino

O que a fé? Para que serve? A fé é útil para os nossos tempos? Qual o tipo de fé ideal? Como é avaliada?
Observemos o belo e direto conceito oferecido pela Carta aos Hebreus: "A fé é um modo de já possuir o que ainda se espera, a convicção acerca de realidades que não se vêem" (Hb 11,1). A fé, aliada à esperança, é algo tipicamente humano que nasce do próprio Deus, e é dado a nós como dom, como virtude. Neste sentido, o Catecismo da Igreja Católica nos ensina: "O ato de fé só é possível pela graça e pelos auxílios interiores do Espírito Santo. Mas não é menos verdade que crer é um ato autenticamente humano. Não é contrário nem à liberdade nem à inteligência do homem confiar em Deus e aderir às verdades por Ele reveladas" (n. 154). Criado à imagem e semelhança divinas, é o homem, no dizer de Santo Agostinho, "capaz de Deus". Logo, crer é um recurso válido para o enriquecimento de sua liberdade e da sua inteligência. Dotado deste recurso, deste impulso interior, chega ele a Deus e, de Deus, pela fé, é capaz de perceber a sua ação providente.
Nisto de a fé estar ligada à esperança, devemos saber que ela é sustentada por aquilo que espero, eclesial e pessoalmente, como conteúdo do que creio. Sendo o conteúdo da nossa fé o próprio Cristo, seu autor e consumador (cf. Hb 12,2), é Ele, "a esperança que salva" (cf. Rm 8,24), Quem nos promete a participação da plenitude do Seu Reino, ou seja, a posse da Sua vida divina, já nos proporcionada pela vida da Igreja e na Igreja, guardiã da fé. Bem nos diz São Pedro: "Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita justiça" (2Pd 3,13).
A fé nos garante o Céu de Deus, prepara-nos, como dom, para o grandiosíssimo dom do "Dia Eterno". E mais: sendo a fé virtude, fortifica-nos nesta jornada, provada e valorizada com tantas situações permitidas por Deus, e que não deve nos fazer pensar que lhes são adversas. A fé é válida, é útil para todos de todos os tempos, principalmente para estes tão nebulosos e turbulentos dias à Igreja do Senhor.
"Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o Reino" (Lc 12,32). Que palavras doces e inspiradoras a quem tem fé, ou mesmo para quem nela está a vacilar! Pequenino, no sentido de reduzido, é um retrato fiel do que poderemos viver - senão já vivemos! - em relação ao número, à quantidade daqueles que, estritamente, vivem de uma fé pura. Palavras proféticas, ilustradas pelo que afirmou o Cardeal Joseph Ratzinger (hoje, Bento XVI), numa de suas homilias radiofônicas em 1969, transformadas em livro, "Fé e futuro": "A Igreja diminuirá de tamanho. Mas dessa provação sairá uma Igreja que terá extraído uma grande força do processo de simplificação que atravessou, da capacidade renovada de olhar para dentro de si. Porque os habitantes de um mundo rigorosamente planificado se sentirão indizivelmente sós. E descobrirão, então, a pequena comunidade de fiéis como algo completamente novo. Como uma esperança que lhes cabe, como uma resposta que sempre procuraram secretamente".
"Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o Reino". Pequenino rebanho, no sentido de vulnerável em si mesmo, mas, devida e providencialmente, assistido pelo Espírito do Senhor da Messe (cf. Mt 9,38) e Esposo da Igreja (cf. Ap 21,2), que a defende e a conduz pela mão. Para tanto, precisamos, para viver de fé e sob a fé, nos desvencilhar de nós mesmos e de nossas pseudosseguranças para nos abandonarmos em Deus, tendo-O por nosso suficiente; Ele que nos diz: "Basta-te minha graça, porque é na fraqueza que se revela totalmente a minha força" (2Cor 12,9).
Para ser um pequenino rebanho, é preciso vigilância para não nos distrairmos com aquilo que, de maneira falsa, aparenta fortalezas e seguranças, desviando-nos Daquele que deve ser o nosso único auxílio. Aqui, penso nas diversas frentes que a vigilância nos deve advertir. Diante de tantas investidas que, discreta e quotidianamente, se apresentam na vida dos cristãos, desde a mais tenra idade.
Neste sentido da vigilância que nos faz prudentes, bem meditava Dom Henrique Soares da Costa: "Dizei: como as crianças podem ter amor a Deus passando horas e horas diante dos filmes e desenhos animados pagãos? Como os adultos podem prender o coração às coisas de Deus, empanturrando-se de dispersão, de novelas e de futilidades mundanas? Como rezar bem se nos apegamos ao conforto desmesurado? Como manteremos nosso fervor dispersos em mil bobagens? Como permanecer atentos ao essencial se vivemos presos às distrações e escravidão das redes sociais? Como seremos realmente fortes na fé sem combater nossos vícios? Como estaremos prontos para levar a cruz na doença, nas dificuldades da vida conjugal, no desafio da educação dos filhos, na luta do combate aos vícios, na busca sincera de sermos retos, decentes e honestos por amor de Cristo? Como viver tudo isso sem a vigilância? Como permanecer firmes na fé católica sem a oração e a procura das coisas de Deus? O Senhor virá na noite desse mundo: 'E caso chegue à meia-noite ou às três da madrugada, felizes serão' (cf. Lc 12,38) se nos encontrar vigilantes! Vigiemos, portanto!".
Sejamos, pois, homens corajosos diante dos atuais combates e incompreensões contrários à fé cristã e à Igreja, travestidos em ataques externos, incertezas internas, calúnias externas, relativismos e radicalismos internos, ideologias externas, minando a fé internamente.
Padre Everson Fontes Fonseca, pároco da paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru)