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A grave lição para a perfeição



Nas bem-aventuranças, aprendemos a imitar Jesus, o Seu jeito, os Seus sentimentos, o como resolver os problemas da vida sem perder o foco do Seu Evangelho. São Paulo, numa de suas cartas, distingue o homem terreno do celeste (cf. 1Cor 15,45-49). Assim, se quisermos viver a altura da vida de Cristo, e, portanto, de cristãos, vivendo os aspectos do homem celeste, não há outro caminho senão os da Bem-Aventuranças.


Também o Antigo Testamento nos aponta para os aspectos de uma vida espiritual, que se afasta do que é instintivo ou até mesmo do brutal. Trago-lhe, caro leitor, o exemplo de Davi. E, para isto, valho-me da sua reação misericordiosa para com Saul, que lhe perseguia a vida. Davi, não se deixando levar pela vingança ou qualquer outro sentimento que lhe estimulava à morte de Saul, seu rival, poupou-lhe a vida. Quando tudo conspirava contra Saul e a favor de Davi, este faz uma bela profissão de fé, crendo na justiça sempre certa do Senhor; justiça esta que contraria as nossas paixões selvagens: “O Senhor retribuirá a cada um conforme a sua justiça e fidelidade” (1Sm 26,23).


Mas, voltemos às bem-aventuranças! Lá, encontramos um profundo imperativo de Jesus: “Sede misericordiosos, como o também o vosso Pai é misericordioso” (Lc 6,36). Nesta exortação, culmina a vivência perene da caridade de Deus em nossas relações. E, assim, com esta ordem do Senhor como ponto nevrálgico do Sermão das Bem-Aventuranças, temos as lições teóricas do amor, do bem-fazer, do perdão, enfim, da comiseração. E, por que digo lição teórica? Porque o exemplo e a prática, sobremaneiramente, os teremos com o Senhor da Cruz, que, ao olhar para os seus algozes, e, neles, para todos nós que, com nossos muitos e graves pecados, machucamos o Seu Divino Coração e O levamos ao máximo Sacrifício, perdoa a todos. Neste intento dirá Jesus: “Pai, perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34).


Ao ordenamento de Jesus para nós retratado por São Lucas, inspirando-nos à misericórdia, temos o correlato apresentado por São Mateus. Enquanto São Lucas retrata a misericórdia como insígnia da vida do Alto, São Mateus escuta o aspecto da perfeição. Ambas visões se complementam: o amor nos faz perfeitos, porque, quando amamos, nos parecemos mais com Deus, que é Amor (cf. 1Jo 4,16). Desta maneira, não existe caminho de perfeição que independa da atitude de amar, de ser misericordioso. É por isso que o Senhor Jesus recorda que o maior mandamento e o princípio de toda lei cristã está, justamente, no amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo (cf. Lc 10,27); só do amor “depende toda a Lei e os profetas” (Mt 7,12.22,40).


Ser homem celeste é uma proposta a ser vivida já aqui e agora, cuja plenitude está no Céu. Ser homem celeste é ter os mesmos sentimentos do Senhor, ainda que, por fragilidade ou tentação diabólica, não consigamos sempre tal boa ventura. Com a nossa natureza inclinada ao mal nem sempre conseguimos. Mas, tentar a santidade, a perfeição, as atitudes de misericórdia deve ser uma constante na vida cristã, seja na minha, seja na sua vida. Então, saíamos das características adâmicas (de Adão, cujo nome inspira barro, lodo) e nos agarremos aos caracteres mais elevados; ao Cristo, que, estendido na Cruz (ainda que no Seu silêncio), nos oferece, encarnado, o exemplo perfeitíssimo encetado pelo Seu Evangelho.


Padre Everson Fontes Fonseca é pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro (Aracaju).

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