A nossa alegria é, antes, de Deus

Estamos no tempo quaresmal. O Domingo que, hoje, a Igreja celebra, o Quarto da Quaresma, é característico, não apenas pela tonalidade rósea dos paramentos envergados pelos seus ministros ordenados, mas, antes de tudo, pela temática da alegria. Na tradição litúrgica, desde há muitos séculos, este é o Domingo da Alegria, o “Domenica Lætáre”. Mas, a qual alegria é referida? Vejamos.
A primeira referência é extraída do Profeta Isaías: “Alegra-te, Jerusalém! Reuni-vos, vós todos que a amais; vós que estais tristes, exultai de alegria! Saciai-vos com a abundância de suas consolações” (66,10-11). A alegria que invade o coração dos cristãos hoje é a da consolação que o Senhor, com quem caminhamos neste tempo quaresmal, nos oferece. Já estamos mais da metade do nosso percurso rumo à Páscoa; enfrentamos tentações (e muitas!), com quedas e acertos, dificuldades, e permanecemos firmes na fé, na esperança e na caridade, amparados pela penitência e pela oração. O Senhor nos consola, porque “todas as vezes que o busquei, ele me ouviu, e de todos os temores me livrou” (Sl 33,5).
Alegramo-nos porque, pelo banho do Sangue Redentor de Jesus, derramado no lenho da Cruz, somos novas criaturas, porque estamos com Cristo (cf. 2Cor 5,17). Sim, “o mundo velho desapareceu. Tudo agora é novo. E tudo vem de Deus, que, por Cristo, nos reconciliou consigo” (2Cor 5,17-18); o antigo adversário e a sua estrutura de escravidão, o pecado, foram derrotados; as nossas faltas, perdoadas. Não queiramos o passado! A alegria da vida nova, a de Cristo em nós, é superior à do pseudocontentamento, de suas fantasias, ilusões e consequentes desilusões. E o apelo de São Paulo aos coríntios, para que a graça, que eleva a nossa alma, não seja por nós desperdiçada, se repete: “Em nome de Cristo, nós vos suplicamos: deixai-vos reconciliar com Deus” (2Cor 5,20). A paz de nosso ser com o Ser de Deus é a felicidade benfazeja, que invade o coração do homem de fé, e o conduz a eternidade, trilhando o caminho de Jesus, perseverante em Seus passos.
Para a elucidação da alegria celebrada neste domingo, tomemos a Parábola do filho pródigo (cf. Lc 15,11-32); logo a alegria do coração de Jesus, que vê os publicanos e os pecadores abeirarem-se para escutá-Lo, em detrimento do incômodo, dos julgamentos e da inveja, que entristecia e sufocava o coração dos fariseus e dos mestres da Lei (cf. Lc 15,1-2). Quantos pecadores se abordaram de Deus neste tempo de conversão e de reconciliação, obedecendo o chamado da Mãe Igreja: “Vem, vem, pecador! Onde tu te escondes? Teu Senhor te chama e, tu, não Lhe respondes”. A alegria é a do Pai misericordioso, que, por sua vez, se alegrou com o perdão recebido e pelo acolhimento daqueles que são amigos do Pai: “Haverá mais alegria no céu por um pecador que se converte do que por noventa e nove justos que não precisam de conversão” (Lc 15,9).
A alegria que vem de Deus e que, por nós, é experimentada hoje, é experiência antecipada do imenso, do infindável júbilo celeste. Não é sem motivos que lemos, no Livro de Josué (cf. 5,9-12), a chegada do povo de Israel, após a caminhada de quarenta anos e da celebração da Páscoa, à Terra Prometida. Mesmo que esta passagem seja uma figura da nossa páscoa eterna em Cristo, com a alegria incomensurável da Pátria que há de vir - e, em mistério, já nos veio -, percebemos que, aquele que já a experimenta, não tem mais necessidade e nem se satisfaz com o maná servido no deserto do mundo, nas miragens dos prazeres, das aparências, das efemeridades, do banal, do passageiro, do ilusório. Porém, desde agora saciados pelo fruto do Céu e do que traz consigo, a saber: da Eucaristia e da sua força. Esta é a nossa alegria, ainda que antecipada, mas eterna.
Não percamos o fervor! Exultemos de fé, prestes a subirmos, mística e liturgicamente, a Jerusalém, onde haveremos de ver Deus sofrer, morrer e ressuscitar, concedendo-nos, para todo o sempre, a felicidade do Seu amor.
Padre Everson Fontes Fonseca é pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro (Aracaju).