A superação do perdão

As palavras da Escritura Sagrada são salutares, principalmente no que toca ao ser humano aquelas atitudes sempre pertinentes de arrependimento, de conversão, de renovação. Ao descobrirmos o grande tesouro, a imensurável satisfação interior que é Deus - e a de sempre redescobri-Lo na eterna e infindável novidade do Seu Ser Divino -, o homem não se sente impelido a buscar o efêmero, as banalidades deste mundo, do pecado, que nos querem raptar da intimidade com o Senhor.
Numa de suas epístolas, o Apóstolo Paulo vai fazer uma belíssima confissão de vida de fé que lançará pistas para que também o cristão, aquele que se enamora de Cristo, deverá fazê-lo: “Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor” (Fl 3,8). A ideia de “conhecer” na Escritura e na mentalidade judaica é a de criar intimidade. Logo, conhecer Cristo é gerar intimidade com Ele, e, assim, nada mais nos atrairá porque somente Ele nos será o bastante.
São Paulo ainda, não se comedindo em transmitir-nos a alegria que sente em ter encontrado o Alguém que faz a sua existência valer realmente a pena, diz-nos mais com palavras repletas de significado: “Por causa dele, eu perdi tudo. Considero tudo como lixo, para ganhar Cristo e ser encontrado unido a ele” (Ibidem). A força da expressão “lixo” como conotação de irrisório, no original grego “skubala” designa fezes, esterco. Com este termo vulgar, Paulo igualmente fala no que consiste uma vida sem Cristo, sem Lhe estar unido pela graça: não possui valor algum. E, consequentemente, tudo o que nos separa do Senhor possui um valor deplorável.
No mundo que prima, vaidosamente, pelo legado de vida que a nossa existência passageira deixará sobre ele, esta convicção de que o viver somente valerá a pena se estiver na união com o Senhor parece uma aberração. Entretanto, para quem descobriu o grande tesouro que é possuir Deus e ser possuído por Ele, este plano de futuro para a eternidade faz todo sentido porque, como nos diz ainda: “Esta consiste em conhecer a Cristo, experimentar a força da sua ressurreição, ficar em comunhão com os seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na sua morte, para ver se alcanço a ressurreição dentre os mortos” (Fl 3,10-11); ou seja: que nada é suficientemente maior para o cristão do que a vida de Deus em nós, já aqui e plenificada na eternidade, e que tudo vale apostar para consegui-la, de maneira que nada mais nos atraia sobre esta terra.
Quando, com esta intenção, começamos a palmilhar a fé (ainda que, por vezes, contemos com as escorregadelas da nossa fraqueza propensa ao mal, e não encaremos esses incidentes como algo normal ou justificável), damos uma nova guinada em nossa vida. Pelo processo de conversão e de busca de reconciliação com Deus, mormente pelo Sacramento da Confissão, entramos na dinâmica misericordiosa do Senhor, que, para salvar o pecador, esquece-Se do pecado que ele cometeu. - Pecador, se desejas, sinceramente, emendar-te com Deus, o Senhor não olhará o teu pecado, mas Se alegrará contigo! Tu, para o Senhor, não és o pecado que cometeste e que, diante Dele, de Sua misericórdia, te arrependes. O que diz o Senhor por Isaías serve para ti: “Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas e que já estão surgindo” (Is 43,18-19).
Isto propôs Jesus à pecadora adúltera: o Senhor “zerou” a sua vida; perdoando-a, renovou-a: “Podes ir e, de agora em diante, não peques mais” (Jo 8,11). Nem a lembrança do pecado que ela cometeu o Senhor deseja que permaneça. O Senhor antecipou para ela o que São Paulo concluiu na Carta aos Filipenses: “[...] esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente. Corro direto para a meta, rumo ao prêmio que, do alto, Deus me chama a receber em Cristo Jesus” (Fl 3,13-14). Isto é não pecar mais.
Ainda que numerosos foram - ou mesmo sejam - os pecados cometidos por nós, aprendamos e sintamos que maior é o amor de Deus pelo pecador arrependido que Lhe busca, e recebe o perdão divino, que ressignifica corações e vidas.
Padre Everson Fontes Fonseca, pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru).