A via do Amor

A vida espiritual requer profecia e denúncia. E intimidade com a Palavra. Os caminhos trilhados nos últimos anos na vida eclesial têm sido em grande parte diversa do Evangelho e da sã Tradição e do Magistério, fruto da experiência com a Palavra. O fim da vida cristã é o Amor. Práticas devocionais desencarnadas geram doenças e neuroses.
Estamos imersos numa cultura de abuso. Abuso de poder e consciência. A vida íntima ao Espírito Santo nos forma para a sequela do serviço. Lia E. Bianchi esses dias e ele falava da "libido da possessão", mãe e cabeça de muitas doenças espirituais. Quanta mente libidinosa, refém do medo e imersa no submundo da violência psicológica e tantas outras. O "medroso" quando cai no campo da neurose religiosa ele se torna refém dos seus medos. A saída? Abusar de si e do semelhante.
A "parresia" dos tempos atuais tem sido a mentira, parte da personalidade doentia. O mentiroso é geralmente medroso e covarde. Ele não vive despido, tem medo do toque e do afeto. Estou falando de cultura de poder que gera pessoas abusadoras. Afeto, amor, corpo, sexualidade são vistos por uma via perigosa em algumas cabeças por aí. Quem mais entende de família que a própria família? Quem mais entende de jovens que os próprios? Quem mais entende da vida consagrada que os mesmos? Demonizamos a sexualidade e o corpo e formamos uma geração que vaga por aí à procura de gurus da "pseudo santidade". Eles falam de tudo, profetas vazios. Não suportam se ver na frente do espelho. Insistimos no diálogo. Insistimos como Francisco.
Precisamos escutar, ouvir, dialogar. Precisamos de sinos e sínodos, sim! Precisamos rever tantas estruturas vazias que não respondem mais a esse tempo. Precisamos bater papo com os jovens sem medo de ouvir o que eles pensam. O que tem feito o Papa? O que tem feito esses homens que gritam por aí nas mídias? Tem ajudado na integração humana, espiritual? Ou estamos ferindo o ser do próximo? Onde estão os pregadores e senhores da boa moral cristã? Estão por onde?
Precisamos ser profetas do amor e da verdade. Acolher! Igreja nem é democracia, citando o Papa argentino, nem é clube de perfeitos. Somos complicados e perfeitinhos, no sentido desumano. Eis o desafio! No sentido que o caminho é o Amor. A vida tem leis que nenhuma instituição seja de qual ordem for poderá lutar contra elas.
Precisamos falar de humanidade para as novas gerações. Precisamos entender que "libido de possessão" é a entrada da perversão do caráter que forma uma geração de pervertidos. Não devemos ter medo dessa leva de maldade em que passa o mundo. E nem devemos ser ingênuos. O mundo anda pelo caminho da via da "aporia" de morte. A morte por si só é vazia, mas quando encontramos o eixo do coração, humanizados e humanos vamos tocando nas feridas da nossa história ajudando o próximo a ver além daquela pregação da pegada que faz sucesso na Net.
Insisto: pregação não muda vida de ninguém, fala angelical pode ser o meio de uma cultura de abuso, o "demônio" é esse aliado de pessoas perversas que andam vagando por aí. Chegamos numa fase da vida em que não podemos mais ser menos de quem podemos ser. Sempre sem julgamentos precipitados. Sempre estendendo a mão a quem necessita.
Concluo, via esses dias o rito exequial do saudoso d. Geraldo Lyrio, homem de profundo conhecimento, homem grande, homem de uma geração que está ficando para trás. Ouvi testemunhos de amigos e amigas que conviveram com ele. Dizia: ele sempre tinha uma palavra que apaziguava. Equilíbrio! Vejamos os famosos da fé. Eles sempre bradam, gritam, tem ciência infusa. Isso mostra o quão imaturos e desintegrados são. Lembro de uma vez que meu pai ousou me dar uma boa surra. Eu insistia para sair com ele e minha mãe e minha tia, ele calmo e tranquilo nunca nos tinha dado um carão. Insisti naquela noite como qualquer jovem que quer ir a uma balada no sábado a noite. E lembro que ele desceu do carro eu corri para um pé de goiabeira que tinha lá em casa. Ele disse, desça! Eu sem chão e morrendo de medo, desci. Ele não me bateu, só disse assim: nunca mais faça isso. No dia que vocês quiserem algo, peça com respeito e vamos ouvir com respeito. Que lição de um coração desvinculado da "libido de possessão". Essa foi uma das aulas mais castas que já recebi.
Vivemos tempos de indecência, onde indecentes apregoam o que tem medo de assumir e viver. O nosso tempo é indecente, parafraseando o poeta. Mas mesmo assim, canto. Canto. Canto outra profecia de integração. Canto Carlo Acutis que me visitou essa manhã, através da amiga Meire em Assis. Trocamos umas palavras de amor, de respeito. Ela dizia padre, que coisa surreal, obrigado pela indicação. E por proporcionar conhecer essa história de Carlo. Essa foi minha oração da manhã. Sem medo dela, do amor, da vida e dos sonhos de Francisco para uma Igreja mais humana e menos institucional. Igreja, casa que acolhe a todos com misericórdia.
A justiça é acréscimo que vem depois do encontro e do olhar de Cristo. Quem resiste ao Seu Olhar? Quem? Me rendo e amo...com parresia e lidibo amoris. Vosso, Pe. Anderson Gomes
Foto: Meirivone Aragão