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Findou o abandono



Aproximando-nos do Natal do Salvador da humanidade, na trilha do Sacro Tempo do Advento, convido ao caro leitor à reflexão sobre a visitação da Virgem Santíssima a Santa Isabel, sua prima e mãe do Precursor; um momento cheio de profetismo e de alegria.


Da profecia de Miqueias, na previsão de Belém como portal da entrada do Salvador, pelo Seu nascimento, na história da humanidade, onde o Eterno submete-Se à temporalidade, o Divino à nossa natureza, temos o retrato de quem representa toda a humanidade, incluindo a sua outrora carência e esperança: Isabel. Assim, ouvimos: “Deus deixará seu povo ao abandono, até o tempo em que uma mãe der à luz; e o resto de seus irmãos se voltará para os filhos de Israel” (Mq 5,2).


Quem era Isabel? Uma mulher velha e estéril, como caduco era o povo de Israel, que não produzia mais frutos senão o pecado. Israel, representado, agora por Isabel, mais tarde pela figueira (cf. Mc 11,11-26; Mt 21,18-22; Lc 13,6-9), na aparência, era vistoso, mas infértil e, consequentemente, infrutífero, pois, nisso se transformou (cf. Is 5,1-7; Jr 2,21). Todavia, da mesma forma como Isabel gemia pela esperança, Israel possuía a expectativa da salvação, que virá por meio do filho da Mulher, o Prometido. Por tal motivo, ao ver Maria, Isabel, não obstante a sua idade e a sua gestação, corre, vai-lhe ao encontro, saudando a Mãe e o seu rebento, efusivamente.


Em suas visões místicas, a Bem-Aventurada Anna Catarina Emmerich, sem contrariar o Evangelho de São Lucas – antes, detalhando-a descritivamente mais –, ilustra-nos o encontro entre as representantes da antiga e da nova Lei, Isabel e Maria, respectivamente: Isabel “[…] cheia de saudade, foi-lhe ao encontro. Maria Santíssima, vendo Isabel de longe e reconhecendo-a correu adiante de José, ao encontro dela. Cumprimentaram-se afetuosamente com um aperto de mão. Nisto vi – confessa Emmerich – um esplendor em Maria e um raio de luz passando dela para Isabel, que se sentiu milagrosamente comovida. Abraçando-se, atravessaram o pátio em direção à porta da casa. Maria e Isabel entraram pela porta da casa no átrio. Ali se cumprimentaram de novo muito afetuosamente, pondo as mãos nos braços uma da outra e encostando face a face. Nisso vi de novo como que um esplendor em Maria, radiando para Isabel, pelo que esta ficou toda luminosa, comovida por uma alegria santa. Recuando com as mãos levantadas. Exclamou, cheia de humildade, alegria e entusiasmo: ‘Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre! Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar? Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança pulou de alegria no meu ventre”.


“Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!” (Lc 1,42). Esta afirmação da anciã Isabel é o cerne, não apenas daquela passagem do Evangelho da visitação, mas de toda a vida de Maria. O júbilo da mãe do Batista não é pela visita da sua parenta, e sim pela chegada Daquele que é o sujeito, não só da sua espera de salvação, mas de todo o Israel. Naquele momento, a antiga desonrada pela esterilidade findada pela concepção milagrosa de João é rejuvenescida pela alegria que perpassa de Maria ao seu coração até chegar à criança que portava no ventre, aquele que viu o dia do Senhor e se alegrou (cf. Mt 3,13ss. et al), e, no término do desabono de Isabel, também Israel é chamado para a salvação, alegre e frutuosa; salvação que ganhou corpo no seio da Virgem Santíssima, a primeira dentre os salvos, a Imaculada em previsão dos méritos de seu Filho e Redentor.


Fazendo a vontade do Pai, abatendo-Se, desde o abaixamento da Sua Encarnação até o ápice da Sua Páscoa, o nosso Salvador veio como oferenda a Deus para a nossa redenção, para a nossa paz – porque é Ele mesmo a nossa paz (cf. Mq 5,4; Ef 2,14) –, para o júbilo do fim da nossa desolação e abandono; porque, como disse Deus em Sua promessa por Miqueias, “o resto de seus irmãos se voltará para os filhos de Israel” (Mq 5,2), e, dessa forma, todos, judeus e pagãos, somos irmanados em Cristo, no vislumbre da face gloriosa de Deus, que, pelo Natal, nos vem estampada no rosto doce e sereno de uma Criança, vero Deus e vero homem, para o benfazejo de todos, a Quem sejam dadas honra e glória para sempre. Amém.


Padre Everson Fontes Fonseca, pároco da paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru).

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