Maria, Sede da Sabedoria

Dentro do cânon bíblico, existe, no coração do Antigo Testamento, um livro que nos desperta a atenção já pelo seu nome: o da Sabedoria. Nesta feita, tendo por vislumbre tal livro, desejo refletir um profundo título mariano: Maria é a Sede da Sabedoria.
Sabedoria. Primeiramente, quero conceituar este dom. Por sabedoria, não a entendamos simplesmente como uma condição de quem tem conhecimento ou erudição; isto é ciência. Antes, porém, tratemo-la como aquilo que de fato é: a Sabedoria é o próprio Jesus, já que, por Ele, todas as coisas foram criadas (cf. Cl 1,16). Confirma isto o que lemos: “Na Sabedoria há um espírito inteligente, santo, único, múltiplo, sutil, móvel, perspicaz, imaculado, lúcido, invulnerável, amante do bem, penetrante, desimpedido, benfazejo, amigo dos homens, constante, seguro, sem inquietações, que tudo pode, que tudo supervisiona, que penetra todos os espíritos, os inteligentes, os puros, os mais sutis. Pois a Sabedoria é mais ágil que qualquer movimento, e atravessa e penetra tudo por causa da sua pureza. Ela é um sopro do poder de Deus, uma emanação pura da glória do Todo-poderoso; por isso, nada de impuro pode introduzir-se nela: ela é um reflexo da luz eterna, um espelho sem mancha da atividade de Deus e imagem de sua bondade” (Sb 7,22-26).
Sim, Jesus é a Sabedoria encarnada porque é o “Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). E isto aconteceu no ventre puríssimo da Imaculada Virgem Maria. Como de fato é atestado pela Carta de São Paulo aos Colossenses, em Jesus “habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl 2,9); e, assim sendo, Maria, ao portar no seu regaço o Deus Salvador, poderíamos dizer sem o receio do exagero, é o endereço daquele que, com a Sua divindade, quis montar a sua habitação entre nós, fazendo-se ‘Emanuel’, Deus-Conosco. É por isso que chamamos a Santíssima Virgem Maria de “Sede da Sabedoria” e de “Arca da Aliança” na sua ladainha.
Habitando no seio de Maria Santíssima quando o Espírito Santo a cobriu com a sua sombra (cf. Lc 1,35), a Sabedoria encarnada comunica-Se com ela, num relacionamento de amor, e de amor único: é bem verdade; de amor-relação de filiação e maternidade. E isso é entrevisto no que ainda do livro da Sabedoria, que, “sendo única, tudo pode; permanecendo imutável, renova tudo; e comunicando-se às almas santas de geração em geração, forma os amigos de Deus e os profetas. Pois Deus ama tão somente aquele que vive com a Sabedoria” (Sb 7,27-28). Mas, este relacionamento não se encerra em Maria; antes, também, na Virgem e a partir ela, é comunicado a nós, que queremos viver na amizade com Deus, sob a égide de Sua vontade. É por isso que, diante daquele elogio que elevaram à Sua Mãe – “Bem-aventurado o ventre que te trouxe, e os peitos que te amamentaram!” (Lc 11,26) –, o próprio Verbo, a Sabedoria encarnada responderá: “Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a palavra de Deus e a observam!” (Lc 11,27).
Maria sempre viveu de acordo com a experiência única que fez com o seu Filho e Senhor. E, por causa disso, sempre se aperfeiçoou nas virtudes. Por sua caridade, via, contemplava, amava e ordenava todas as coisas de acordo com essa experiência divina, julgando tudo o que lhe acontecia – ainda que não o entendesse – com a luz poderosa e amorosa que inundou o seu coração. Valendo-nos do relacionamento mútuo existente a Sabedoria e a Sua Sede, a Virgem Santíssima, podemos pedir a esta – e ela no-lo alcançará do Espírito Santo de Deus – o dom da sabedoria, que nos faça conhecer e saborear Deus, e nos coloque assim em condições de podermos avaliar com verdade as situações e as coisas desta vida (cf. São Josemaría Escrivá. In: É Cristo que passa, n. 133), sabendo que, por este dom, como Maria, conservaremos todas as coisas em nosso coração (cf. Lc 2,19.51). Então, nunca é demais pedir tal graça. Aliás, ela é urgente para todos nós que, como Maria, queremos ser mais que amigos de Deus, desejando ser um com Ele.
Com o auxílio da Virgem, com o seu patrocínio, para que dele nos valhamos, possamos, como instrumentos, levar a Sabedoria divina em nossas vidas. E pela amizade que Lhe temos, sujeitos à Sua vontade, levá-la a tantos corações que se deixam arrastar pelo obscurantismo e pela ignorância de Deus. Amém.
Padre Everson Fontes Fonseca é pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro (Aracaju).
Foto: Fernando Nunes