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O direito e a união estável dos casais


O direito é compreendido pela maioria dos estudiosos como um instrumento de adaptação social. O direito é um instrumento humanista por excelência, pois se posiciona ao lado da pessoa humana em quaisquer circunstâncias, e sobretudo, naquelas que são tomadas por maiores índices de vulnerabilidade. Resgatar e tutelar a dignidade da pessoa humana, é o escopo irrenunciável do direito em todas as suas instâncias.


As realidades sociais que fragilizam a grandeza da pessoa humana, encontrarão o esforço do direito para desmascará-las e desvelar as novas estradas. O esforço do direito visando proteger a pessoa humana é perceptível em várias direções, como por exemplo: o quesito da relação entre o homem e a mulher, e também entre as pessoas que são do mesmo sexo. 


A união estável entre pessoas do mesmo sexo foi aprovada no Brasil em 2011, através de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), vinculando todos os tribunais do país. A referida decisão do STF, está contida na Ação Direta de Inconstitucionalidade, a ADI 4277, e também na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, a ADPF 132. A união estável entre homem é mulher antecede a decisão do STF supramencionada, pois é tratada com pormenores numa lei de janeiro de 2002, mais precisamente na lei 10.406. 


A referida decisão do STF e a lei 10.406/02 acentuam a dignidade daquelas pessoas que permaneceram invisíveis por longos anos de relacionamentos. O direito não quer mantê-las debaixo dos tapetes sociais. A quantidade de anos para que a relação seja considerada união estável, tem sido rediscutida pela jurisprudência contemporânea, mas aquilo que é central para caracterizar a união estável está no art. 1.723 do Código Civil, que expõe três quesitos: convivência, publicidade, desejo de constituição familiar. Eis o que diz o artigo: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.


A interpretação jurídica sobre o relacionamento levará em conta os três elementos do art. 1.723 do Código Civil. A ausência de um dos elementos pode descaracterizar e fazer com que a relação não seja considerada como uma união estável. E o reconhecimento da união estável é imprescindível para o passo incisivo do artigo 1.725 do Código Civil, que reside na comunhão parcial dos bens, salvo diversamente disposto. O artigo supramencionado declara que: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”.


Comumente, ao longo desses relacionamentos houve aquisição de bens, a construção de um lar, a edificação de um patrimônio que muitas vezes após o fim da relação, permanecia à disposição de uma única pessoa, mesmo tendo sido edificado com os esforços de ambos. Uma situação bem comum é que com a morte de um dos membros do casal, os bens eram partilhados apenas entre os familiares, excluindo a pessoa com a qual se construiu a vida. Segundo o artigo 1.790 do Código Civil: “A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável [...]”.


A união estável pode ser devidamente registrada, caso seja vontade do casal, mas a união estável é antes de tudo uma relação de fato, que pode ser reconhecida até após a dissolução da mesma, desde que verificados os requisitos do art. 1.723 do Código Civil, que já foram anteriormente mencionados e tomando as medidas jurídicas cabíveis nas esferas cíveis.


A lei 10.406/2002 e a referida decisão do STF, são mecanismos jurídicos do direito atual, capazes de fazer justiça a tantas pessoas que foram injustiçadas por seus companheiros. O direito contemporâneo lança luzes sobre relacionamentos que permaneceram obscuros por anos, mostrando que deve haver um correto equilíbrio e não lesões entre as partes.


Inúmeras pessoas ficaram sem casa, sem renda, ou seja, tiveram prejuízos psicológicos, morais e econômicos, após o término de seus relacionamentos. O direito está pronto para protegê-las de tais situações, respeitando a dignidade humana e o exercício da cidadania.


Pe. João Claudio é advogado, e tem feito estudos no âmbito do direito civil. Atualmente é pároco da paróquia Santa Teresinha (Bairro Robalo). 

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