Olhou, com amor, para a Sua serva (Parte 1)

O olhar divino acompanha sempre as Suas criaturas. Não seria diferente em relação a Maria, a Sua benditíssima serva, criatura mais perfeita, que, cheia de graça, enche os olhos do Criador. Nesta nossa reflexão, perpassemos, ainda que sorrateiramente, as Sagradas Escrituras, e percebamos como, de maneira misteriosa, entrevemos o olhar benigno de Deus sobre aquela que Ele escolheu para ser a Sua Mãe.
Antes mesmo de criar o homem à Sua imagem e semelhança (cf. Gn 1,26), o Senhor, que conhece os corações e respeita a nossa liberdade, sabia que, a partir dos nossos primeiros pais, a humanidade, muitas e muitas vezes, optaria pelo pecado. Por isso, Deus, consciente da inteireza do coração de Maria em cumprir a Sua vontade, a reservou, preservando-a de toda mancha de pecado, justamente em previsão da salvação que Ele mesmo, na Pessoa Divina do Filho, haveria de levar a termo. Diante desta escolha e reserva de Maria, a Imaculada, Santo Agostinho dizer que, juntando todas as águas, Deus fez o mar, e, juntando todas as graças, Ele fez Maria, criatura perfeita, que, desde sempre nos planos divinos, encheu os olhos de Deus.
Ainda que o Gênesis nos fale, por duas vezes, da obra da criação, apresentando-nos a perfeição concernente a tudo o que foi criado, nenhuma obra divina foi mais especial do que Maria. Por isso que, já na mente de Deus, quando da queda de Adão e Eva, em relação à Maria, termos a seguinte profecia dirigida à serpente: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e aquela que, dela, nascerá. Ela te pisarás a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar" (Gn 3,15). A perfeição de Maria faz com que ela seja totalmente alheia à imperfeição do mal, porque o pecado é um desvirtuamento da beleza com que fomos, amorosamente, criados; o pecado nos deforma, enfeiecendo a nossa alma.
Passando mais adiante, temos a nobreza com que a arca da aliança foi feita, a mando de Deus por Moisés (cf. Ex 25,10-22); e não apenas a arca, como também a tenda do santuário (cf. Ex 25-31.35-40). Moisés copiou o que vira. Aqueles artefatos que, juntamente com o povo de Israel, peregrinavam pelo deserto, eram figuras de uma realidade mais sublime: a do Céu, a da morada de Deus. Trazendo para Maria, a coroada das realidades celestiais, a temos, ao que a invocamos em sua ladainha, como "Arca da aliança", "Vaso espiritual", "Vaso honorável", "Vaso insigne de devoção", "Porta do Céu".
A beleza de Maria também pode ser contemplada na noiva do Cântico dos Cânticos, tida como a mais bela das mulheres (cf. 5,9.6,1), ao que ela mesma diz de si, em profunda humildade, que não despreza a veracidade de quem seja: "Sou morena, mas sou bela, ó filhas de Jerusalém" (Ct 1,5). E por que morena? Pela incansável procura em fazer a vontade de Deus. Aquela a quem julgamos ser integralmente bela tem a sua perfeição proveniente de seu coração, cheio da graça do Senhor.
E o que dizer da beleza da Rainha Ester, que encheu, embora interiormente estremecida, os olhos do Rei Assuero? Ela também figura Maria que, incansavelmente, implora em benefício nosso, pobres pecadores. Deus, com os olhos cheios da beleza de Maria, estende-lhe o cetro para, através da Medianeira de todas as graças, conceder-nos Seus favores para nossa vida, para nossa salvação. E, juntamente com Ester, todas as piedosas, valorosas e belas mulheres do Antigo Testamento apontam para Maria e a figuram.
No nosso próximo encontro, trataremos, não mais das figuras da Virgem no Antigo Testamento, e sim de sua própria pessoa no Novo. Que, abstraindo para a nossa vida santos propósitos do exemplo de Maria, enchendo também nós os olhos divinos, sejamos patrocinados com a sua grande proteção. Até lá!
Padre Everson Fontes Fonseca é pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro